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Ensino Rural Paulista

Desde o fim do século XIX, a produção agrícola era vista como alternativa para o progresso econômico do Brasil. Sua marca mono-exportadora entrava em conflito com os modos de produção industrial que exigiam uma maior diversificação na produção de matéria-prima. Uma possibilidade seria optar pela policultura, atrelando ensino e novas tecnologias de plantio, como ocorreu em São Paulo com a criação da Escola de Agricultura de Piracicaba em 1892 - que passou a ser denominada Escola Agrícola Prática “Luiz de Queiroz”, em 1901 -, da Estação Agronômica de Campinas e do Instituto Agronômico, em 1897, ambos na cidade campineira.

Nos debates realizados na esfera pública havia o receio de que as populações rurais migrassem para as cidades, como ocorreu em alguns países da Europa no século XIX, e que o campo fosse ocupado por imigrantes que poderiam requerer as terras produtivas como suas propriedades. Além disso, havia também a aspiração de que o Brasil entrasse na economia competitiva internacional oferecendo produtos de interesse do capital. Uma das instâncias sociais que contribuíram para a disseminação e incorporação de tais discursos foi a escola rural.

 

Em São Paulo ocorreu uma gradação da escola rural no ensino público estadual. Na década de 1910, as escolas tinham que ter “feição agrícola” (SÃO PAULO. AEESP, 1909-1910), de modo que “A proposta não era “converter as escolas públicas em aprendizados agrícolas”, mas aproveitar as lições do ensino intuitivo e destacar a vida no campo pelo lado higiênico, econômico e das belezas naturais, tentando fazer uma oposição ao urbanismo. Thompson, Diretor de Ensino do Estado de São Paulo, enviou uma circular aos diretores de grupos escolares solicitando que, a “título de ensaio”, fossem ministrados os “fatos agrícolas” aos alunos do 4º ano, de preferência ao ar livre, com o intuito de promover a “experiência” (ECAR, 2017, p. 38). Em 1918, com o Decreto n. 2.944, as escolas do Estado de São Paulo foram classificadas em rurais, distritais e urbanas dando visibilidade aos diferentes tipos de instituições de ensino, e após dois anos, a Lei n. 1.750, de 08 de dezembro de 1920, propunha a expansão do ensino primário visando sobretudo as escolas instaladas nas zonas rurais, maior contingente à época.

 

A ampliação do ensino necessitava de um modo de ensinar que alcançasse alunos tanto das zonas urbanas quanto das zonas rurais. Com tal prerrogativa, alguns educadores passaram a veicular os ensinamentos da Escola Ativa, de matriz europeia, adaptando-os à realidade brasileira. Não sem tensão, a Escola Ativa foi adotada de formas as mais diversas por educadores brasileiros, e, no que diz respeito ao ensino rural, podemos falar dos grupos de escolanovistas e ruralistas pedagógicos. Tanto a proposta dos escolanovistas quanto a dos ruralistas pedagógicos reconhecia a natureza como parte da aprendizagem dos alunos, o forjar-se cidadão para contribuir com o progresso do país e o trabalho como princípio da educação civilizatória. As propostas divergiam apenas no quesito atendimento, pois os ruralistas pedagógicos visavam um ensino específico para as escolas rurais, enquanto os escolanovistas consideravam a escola como instituição universal, portanto, uma escola única e, por conseguinte, democrática.

 

No grupo dos ruralistas pedagógicos, Sud Mennucci se destacou como defensor de um ensino rural adaptado às necessidades dos alunos do campo. Em 1932, Mennucci foi convidado a ocupar a Diretoria de Ensino do Estado paulista. Nessa época, nomeou Noêmia Saraiva de Mattos Cruz para trabalhar no Grupo Escolar do Butantan, para que ali a professora iniciasse uma experiência de ensino rural. Cabe pontuar que a década de 1930 foi um momento no qual a produção industrial brasileira aumentou, e, sobretudo em virtude do crack da Bolsa de Nova Iorque, o país importou menos produtos básicos. Nessa década também ocorreu uma expansão das indústrias alimentícia e farmacêutica que passaram a ampliar o escopo para a América Latina, não raro, jornais e revistas divulgavam uma nova forma de cuidado do corpo, principalmente, no que dizia respeito à alimentação e ingestão de medicamentos. Também, em 1932, foi criada a Sociedade dos Amigos de Alberto Torres, uma instituição privada que visava a criação de clubes agrícolas, especialmente nas escolas, com o objetivo de incentivar a fixação do camponês ao seu local de origem. Este contexto alavancou a criação de escolas rurais no Estado de São Paulo.

Até 1933, o Estado paulista tinha 22 grupos escolares rurais em funcionamento, sendo 21 localizados em Piracicaba e 1 no Butantan. Outros 9 grupos escolares foram criados entre 1935 e 1947, sem contar as granjas escolares e escolas isoladas que tinham a mesma orientação (MORAES, 2014). O crescimento de escolas rurais em São Paulo teve como objetivo persuadir os habitantes das zonas rurais para que não houvesse evasão do campo, o que ocorreu com expressividade a partir da década de 1950. A expansão do ensino para as zonas rurais pretendia também alcançar um grande número de brasileiros analfabetos, com o intuito de “torná-los verdadeiros cidadãos”. As leis e decretos sobre ensino rural foram feitas de uma forma verticalizada, sem a participação dos habitantes do campo e muitas vezes gerava embates entre as famílias dos alunos e a escola. Paschoal Leme em Problemas brasileiros de educação (1945/1959), atribuiu as “mazelas” do campo à falta de estudos compatíveis com o meio em que as crianças viviam, e Zeila Demartini (1979) concluiu que não havia escolas em número suficiente para atender os alunos das zonas rurais.

 

Palavras-chave: ensino rural paulista; escolanovismo; ruralismo pedagógico.

Referências Bibliográficas

DEMARTINI, Zeila de Brito Fabri. Observações sociológicas sobre um tema controverso: População rural e educação em São Paulo. Tese de Doutorado. Departamento de Ciências Sociais (Sociologia), Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo, 1979.

 

ECAR, Ariadne Lopes. Debates sobre ensino rural no Brasil e a prática pedagógica de Noêmia Saraiva de Mattos Cruz no Grupo Escolar Rural de Butantan (1932-1943). Tese (Doutorado em Educação), Faculdade de Educação, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2017

 

MORAES, Agnes Iara Domingos. Ensino primário tipicamente rural no Estado de São Paulo: um estudo sobre as Granjas Escolares, os Grupos Escolares Rurais e as Escolas Típicas Rurais (1933-1968) Dissertação (Mestrado). Faculdade de Filosofia e Ciências, Universidade Estadual Paulista, Marília, 2014.

Autoria: Ariadne Lopes Ecar

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