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Olinda Magarotto dos Santos 

(Marília, 11/02/1934)

Aos onze dias de fevereiro de 1934, na cidade de Marília, que está localizada a 456 quilômetros a Oeste da capital paulista, nasceu Olinda Magarotto dos Santos. Filha de pais italianos, Olinda teve três irmãos: dois mais velhos e um mais novo.

Sua escolarização foi no colégio "Sagrado Coração de Jesus", fundado na cidade de Marília em 1934 e mantido sob os cuidados de freiras Apóstolas do Sagrado Coração. Esse colégio abriu as suas portas como internato e ofereceu apenas curso primário até 1937, quando passou a oferecer, também, o curso ginasial. A partir de 1943, como Escola Normal Livre, esse colégio passou a oferecer o curso normal. Nessa instituição, Olinda formou-se professora normalista no ano de 1953.

É pertinente destacar a importância que as Escolas Normais Livres tiveram na formação de um quadro de professores para atuar em áreas mais afastadas da capital paulista, bem como o impacto que a Reforma de 1927 teve ao equiparar essas instituições às Oficiais, mantidas pelo Estado. As escolas denominadas Normais Livres eram organizadas a partir de iniciativa municipal ou particular e não gozavam de reconhecimento estadual no que se refere aos seus diplomados. Desse modo, aqueles que se formassem por essas instituições poderiam exercer a profissão docente apenas em escolas primárias particulares ou como professores leigos.

Todavia, frente à grande demanda por professores especialmente nas cidades afastadas da capital e à incapacidade financeira do Estado de criar novas Escolas Normais, em 1927, uma reforma de ensino implementada por Amadeu Mendes, então Diretor Geral da Instrução Pública de São Paulo, equiparou as Escolas Normais Livres às Escolas Normais Oficiais. Por meio dessa medida o reformador alçava expandir o curso normal para o interior do estado e, por consequência atender às reivindicações acerca da educação primária.

Para ter certa dimensão, até 1927, havia dez Escolas Normais Oficiais no estado de São Paulo; após a Reforma, foram equiparadas 26 Escolas Normais Livres, duas na capital e 24 no interior (INOUE, 2015). O aumento na quantidade de matriculados foi acentuado e vale mencionar o lugar ocupado pelas instituições de ensino confessionais na disseminação do curso normal, por meio da criação de novas instituições (INOUE, 2012). Todavia, a expansão na criação de Escolas Normais Livres pelo estado não ocorreu de modo uniforme, conforme Tanuri (1979) e Inoue (2015) destacam. A região oeste do estado, onde se localiza a Escola Normal Livre do “Sagrado Coração de Jesus”, por exemplo, teve expansão tardia se considerarmos o ano de publicação da reforma: apenas a partir da década de 1940. Em razão de certa escassez de escolas desse tipo até então, o “Sagrado Coração de Jesus” atraía muitas jovens de cidades vizinhas, algumas, inclusive situadas a centenas de quilômetros de distância.

Nos altos de seus 83 anos de idade, os relatos de Olinda a respeito dos anos em que cursou a Escola Normal Livre revelam a grande admiração pelos professores de português e de latim, especialmente; revelam, também, o temor que a presença das freiras gerava, bem como certo arrependimento de ter sido tão pacífica em relação a alguns valores impostos e disseminados no colégio confessional.


Após formada, Olinda casou-se e teve filhos tendo ingressado na carreira docente apenas em 1967, em uma escola rural situada em Caiuá, cidade localizada a 249 quilômetros de distância de Marília. Como diversas outras professoras do interior do estado de São Paulo, Olinda percorria caminhos longos para chegar até a escola rural: utilizava trem, caminhões, tratores, charretes, jardineiras e animais como meios de transporte.

A trajetória de provimento das professoras que se formavam nas Escolas Normais, fossem elas Livres ou Oficiais, passava pelo cumprimento de períodos em escolas isoladas, geralmente rurais e afastadas dos centros urbanos. Legalmente, o provimento inicial das professoras recém-formadas deveria ser em uma escola isolada rural ou distrital, na qual permaneceria por um ano. Após esse período, a professora poderia solicitar remoção para as escolas isoladas urbanas, na qual ficaria por mais um ano; somente então, após dois anos de um “período de desterro” – como era comumente
denominado pelos inspetores e delegados de ensino – as professoras poderiam solicitar remoção e serem nomeadas docentes de grupos escolares, instituições de ensino modelar, implantadas no estado de São Paulo a partir de 1893.

É preciso frisar, entretanto, que esses dispositivos legais acerca do provimento e da remoção na carreira docente não necessariamente eram cumpridos. Tanuri (1979) e Demartini (1989) destacam a frequência com que o uso de alianças políticas e de apadrinhamentos funcionou de modo paralelo aos concursos públicos de remoção de professores ao longo da primeira metade do século XX e até mesmo posteriormente.


Esse quadro auxilia a compreensão da circulação dessas professoras formadas por diferentes instituições de ensino primário ao longo de suas carreiras profissionais entre ao longo do século XX no interior do estado de São Paulo. Enfrentando as condições adversas das escolas isoladas rurais, afastadas dos perímetros urbanos e muitas vezes condenadas ao isolamento, as professoras primárias atuavam de modo contundente no sentido de implementar ações inovadoras e adaptadas às realidades as quais estavam inseridas.

Olinda circulou por diversas cidades da região de Marília, atuou em instituições variadas e acumulou pontos, por meio dos progrediu na carreira. A transferência e efetivação em escola urbana localizada em Marília, porém, só ocorreu durante a década de 1970 em razão de o marido, que também era professor na cidade de Marília, ter conseguido tramitar pedido amparado em termos legislativos para remoção de cônjuge para a cidade em que ele trabalhava.

Em seu percurso profissional, Olinda foi professora substituta em grupos escolares, em escolas confessionais, foi coordenadora de escola de 1º grau e evidenciou o comprometimento com a sala de aula, participando de cursos de capacitação periodicamente e tendo se formado Pedagoga pela Faculdade de Educação, Filosofia, Ciências Sociais e de Documentação da Universidade Estadual Paulista, em 1979.

Como muitas de suas colegas de profissão, Olinda teve que enfrentar as dificuldades de ser professora e lidar com entraves na ascensão na carreira no magistério, o que relata ter sido diferente para seu marido que rapidamente escolheu escolas urbanas para atuar.

Os dilemas pelos quais essa professora e outras tantas professoras que povoaram o interior do estado passaram trazem à tona questões cruciais a respeito das inúmeras mulheres-professoras que se empenharam em transpor limites sociais, culturais e familiares.

Sobre a atuação profissional de Olinda ainda há muito a ser pesquisado. Sua memória vívida tem produzido relatos que evidenciam que ela não esteve à parte das diversas discussões e debates que permearam o campo educacional entre as décadas de 1950 e 1980, muitos dos quais envolvidos nas questões de acesso, de inclusão e de permanência dos alunos de condições sócio-culturais diferentes nas escolas primárias.


Olinda Magarotto dos Santos é um exemplo dessas mulheres cujas histórias estão para ser escritas. Como professora, Olinda trabalhou durante 25 anos e meio; aposentou-se em 1985 e, atualmente, dedica-se à pintura em tela e em porcelana e ao teatro. Essas atividades artísticas, segundo ela, sempre estiveram presentes em sua vida; além de embelezarem sua casa e a de seus familiares, mostram a delicadeza do olhar atento e cuidadoso dessa mulher-professora para com a vida e para com as pessoas.

A produção existente em história da educação sobre a educadora

A produção existente a respeito de Olinda Magarotto dos Santos é bastante incipiente. O único livro que a menciona se trata de um estudo memorialístico acerca da história da cidade de Marília.


Rosalina Tanuri (2003), membro da Comissão Organizadora dos Registros Históricos da Câmara Municipal e da cidade de Marília, apresenta uma coletânea de crônicas sobre “as raízes da cidade” e menciona Olinda como uma heroína do sertão paulista. Segundo Tanuri (2003), Olinda e outras professoras foram mulheres guerreiras e contribuíram para o processo de disseminação da escolarização primária nos rincões do interior do
estado.

Palavras-chave: Escola Normal Livre; Escola primária; Trajetória profissional; Escola Isolada Rural.

Bibliografia:

Demartini, Zeila de Brito Fabri. (1989). O coronelismo e a educação na Primeira República. Educação & Sociedade, 3, 44-74.

Inoue, Leila Maria. (2015). Entre Livres e Oficiais: a expansão do ensino Normal em São Paulo (1927-1933). Dissertação de mestrado, Universidade Estadual Paulista, Marília, SP, Brasil.


______. (2012). Igreja Católica e formação de professores em São Paulo: a Escola Normal Livre Sagrado Coração de Jesus (1943). In: Anais Congresso Luso-Brasileiro de história da educação, Cuiabá, MT, Brasil, 7.

Tanuri, Leonor Maria. (1979). O ensino normal no estado de São Paulo: 1890-1930. São Paulo: EDUSP.


Tanuri, Rosalina. (2003). Marília, chão do nosso amor. Marília.

 

Imagens do acervo pessoal de Olinda Magarotto dos Santos


A entrevista realizada com Olinda Magarotto dos Santos foi gravada em formato de áudio.


Autoria: Angélica Pall Oriani

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